Morôni Laurindo do Nascimento
“Já me falaram essa história que ela não tinha morrido que ela não morreu. Se eu to lá incomodado com isso. Esta tia que eu conheço morreu. Tem outra Marcelina que não morreu. E tem outra Marcelina que tá viva. E tem outra Marcelina que tá aqui. Tem outra Marcelina que vai entrar ali pela aquela fresta, que ta ali, por aquele buraco que tá ali. Tem outra Marcelina que vai sair lá na caixa-prego. São tantas tias Marcelinas que o mundo se marcelinizou-se”
No ano de 2007 tive a oportunidade de participar, como assistente de direção, na produção do documentário 1912: O Quebra de Xangô (DOCTV-2007)
O documentário foi dirigido pelo antropólogo - cineasta Siloé Amorim
Para a confecção desta obra foram filmadas entrevistas com intelectuais, além de serem percorridas algumas casas de cultos afrobrasileiros de Maceió e de outras cidades alagoanas (Cajueiro, Atalaia e Limoeiro de Anadia), tendo sido também incluído o terreiro da Nação Xambá, localizado em Olinda-PE. Foram realizadas entrevistas com adeptos de tais casas de cultos.
Para a realização do documentário, buscou-se depoimentos sobre o “Quebra dos Terreiros”, ocorrido em Maceió, em 1912, que consistiu na destruição de vários terreiros de Xangô e perseguição a seus adeptos.
Desta minha experiência surgiram as primeiras reflexões que resultaram em meu Trabalho de Conclusão de Curso, no qual fundamento o presente artigo. Assim, o material não editado, gravado em DVD, também é utilizado como fonte de dados etnográficos.
Os depoimentos registrados podem servir para uma reflexão sobre a identidade religiosa afro-brasileira em Alagoas, num momento em que a câmera representa um meio de expressão oral e imagética, para aqueles que a sociedade alagoana quis manter invisíveis e silenciosos.
O episódio conhecido como Quebra dos terreiros, ocorreu na noite do dia 1º de Fevereiro de 1912, em Maceió. As casas de cultos afro-brasileiros, os Xangôs, foram invadidas, às vésperas do carnaval, por populares liderados pela Liga dos Republicanos
Combatentes
. Essa associação, constituída por uma maioria de operários, era liderada pelo tenente reformado do exército, veterano da guerra de Canudos, Manoel Luiz da Paz.
Nesta noite foram destruídos paramentos e utensílios religiosos e espancados sacerdotes e filhos de santo. Uma turba, em procissão de escárnio e algazarras, percorreu a cidade, profanando os terreiros e recolhendo seus objetos sagrados, que tiveram como destino serem jogados em uma grande fogueira em via pública
Ação violenta que se estendeu para cidades circunvizinhas.
Segundo Abelardo Duarte (1974:12) um dos primeiros terreiros a serem atacados foi o de Tia Marcelina que “recebeu na ocasião do Quebra-Quebra, em sua casa, um golpe de sabre na cabeça, violento golpe que a deixou prostrada e banhada em sangue” Continue Lendo
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