Jocão ,o Münchhauseniano : As Fronteiras da Sanidade e os perigos da periculosidade

Jocão ,o Münchhauseniano

Meu pai contava sempre uma história sobre um Sr. chamado de Jocão como forma de ensinar que a verdade é o bem maior que deve ser cultuado por todos nós.Ele sempre educava e ensinava aos seus filhos através de histórias que mais pareciam um ludismo  hilário sobre a vida.

Tenho uma recordação sobre uma delas, que fala sobre a periculosidade do mentiroso: Certa vez Jocão ao passar no antigo Café Central , no Centro da cidade de Maceió , encontrou um grupo de amigos que logo pediram a Jocão de forma uníssona : Jocão amigo velho, conta uma das suas" histórias"! Triste ,Jocão assim falou : Hoje não posso, pois estou providenciando o enterro de minha mãe que foi vítima de um Infarto na manhã de hoje. Calados e com semblantes de compaixão , seus amigos fizeram uma cota , e doaram todo o dinheiro que tinham para o Jocão .Os amigos ainda  consternados com o triste acontecimento foram ao mercado da produção comprar flores e velas para  no final da tarde levarem a residência da mãe de Jocão, onde o corpo estava sendo  velado.

Algumas horas mais tarde os amigos de Jocâo quando já estavam bem próximo a esquina que dava acesso a  casa onde o corpo estava sendo velado, já começaram a escutar a maior balbúrdia ! Alguns passos mais adiante puderam então ouvir e ver o Jocão bebendo as custas do dinheiro recebido naquela manhã, e com sua viola  cantarolava em versos e prosas para todos os presentes, a façanha de como é fácil  iludir um grupo de pessoas contando uma "simples mentira".


Comentário

 Após a história sobre o Sr. Jocão podemos observar que o limite entre normalidade e o ser patológico é tão tênue como o estado de vigília e o sono profundo.Eles coexistem em simbiose latente ,passando a assumir uma de suas faces conforme a informação genética que vive em íntimo relacionamento com os fatores externos de cada ser humano , e somente assim, poderá ou não desencadear a manifestação do lado bom ou mau, em maior ou menor intensidade ,em algumas pessoas ou grupos sociais .

A concepção da mentira sempre se embasa na intencionalidade do mentiroso que não suporta a simples ideia de ser comum, normal, trivial,popular... . Ele necessita possuir uma imagem de um humano super especial,intelectual e possuidor de peculiaridades completamente excepcionais e fantásticas não encontradas em mais ninguém.

Então para conter este ser humano adepto de uma “pseudologia fantástica”se faz necessário a presença do direito a criar regras aceitas como normais para a composição de uma sociedade não patológica.



Na maioria das vezes ,as palavras servem para esconder o mal que está imerso na alma de quem as professa ! ( Mário Augusto)




O artigo : Entre o crime e a loucura: os casos limítrofes e sua temibilidade


"Antigamente a loucura era considerada um “estado perigoso”, no qual devido a seu pensamento delirante o insano podia cometer atos desvairados. Contudo, perante a medicina mental e o direito, embora os loucos fossem temíveis, eles não eram associados diretamente ao crime. Loucura, embriaguez, paixão constituíam “estados perigosos” por desencadearem alterações do psiquismo que o tiravam de sua condição normal e, em sua anormalidade relativa, poderiam originar atos violentos. Desde as primeiras discussões entre medicina mental e direito, os crimes cometidos nestes “estados perigosos” não representaram grandes dificuldades seja a juízes ou alienistas, pois bastava considerar um deles como razão do crime para que crimes aparentemente “irracionais” juridicamente passem a fazer sentido em termos jurídicos.


O real desafio aos tribunais eram aqueles crimes nos quais o autor não era louco, não padecia de qualquer delírio e, muitas vezes, destacava-se não pela intensidade de suas paixões, mas pela frieza com a qual descrevia os crimes que cometera. Entretanto, mesmo não se tratando de um insano ou apaixonado, algo no crime cometido não permitia considerar seu autor um criminoso normal. Talvez por sua extrema brutalidade, ou ainda, em outros casos, pela total ausência de justificativas racionais para o ato criminoso. Os autores deste tipo de crime estão na fronteira entre o criminoso comum e o louco. São os chamados fronteiriços ou limítrofes. Usualmente situados entre o domínio da patologia e da teratologia, quando eram autores de crimes, a anormalidade psíquica destes limítrofes parecia identificar-se com o próprio crime na qual se manifestava. Conseqüentemente, o direito e a medicina mental acabaram por considerá-los os criminosos mais perigosos, uma vez que sua anormalidade geralmente era identificada como afetando, quando não anulando, seu senso moral, o que acabava por torná-los insensíveis à intimidação penal.


Embora a periculosidade seja suposta nos “estados perigosos”, em geral, é no caso dos limítrofes que ela atinge seu limite máximo. São eles os “indivíduos perigosos”, os “inimigos públicos” das descrições históricas do alienismo, da psiquiatria e da criminologia. Dado que não eram apenas criminosos, bem como não chegavam a ser insanos, a eles não serviam o manicômio e a prisão. O estorvo que sua presença causava nestas instituições levou as primeiras iniciativas pela criação de uma instituição híbrida a eles destinada: o manicômio judiciário. Foi esta a motivação explicitada por Jacintho Godoy para a criação do Manicômio Judiciário do Rio Grande do Sul (MJRS) em 1925, atualmente IPFMC. " (Francis Moraes de Almeida,Fronteiras da Sanidade Da “Periculosidade” ao “Risco” na articulação dos discursos psiquiátrico forense e jurídico no Instituto Psiquiátrico Forense Maurício Cardoso de 1925 a 2003) Leia mais aqui


“A injustiça e a instabilidade no espírito de alguns homens, sua desordem e falta de medida são as conseqüências últimas de inumeráveis inexatidões lógicas, de falta de profundidade, de conclusões prematuras das quais seus antepassados se tornaram culpados”.
Nietzsche

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