Carta aos nobres doutores advogados




“Uma explicação é algo sempre incompleto; sempre podemos suscitar um outro por quê, e esse novo por quê talvez leve a uma nova teoria, que não só explique, mas corrija a anterior” (Karl Raimund Popper)

De Bacharéis em direito, para os doutores.




Prezados, quero manifestar-me de maneira pacífica. Não tecerei comentários, no momento, sobre a inconstitucionalidade do exame de ordem.



Reporto-me, exigindo dos doutores, respeito para com os bacharéis; que nada têm de ignorantes, da mesma forma, que os respeitamos, até mesmo, àqueles, que são hoje inscritos nos quadros da nobre instituição, e não passaram pelo dissabor de serem avaliados pela mesma, amargando humilhações e insultos, sofrendo pressão de toda espécie no dia do exame, a exemplo do último, em que houve até revista com detector de metais na entrada e saída dos banheiros (nem sempre suficientes) nos locais de prova; em alguns casos, até mesmo ameaçados, com advertências de fiscais (que não eram nem bacharéis); do tipo: “ Se falar “a”, a prova será anulada, não é nem para olhar um para o outro...coisas assim, vexatórias e humilhantes, como se fossemos escória, ou detentos enfileirados para revista.


O direito de livre expressão de pensamento, é constitucionalmente, vedado o anonimato. Num Estado democrático de direito, são inconcebíveis; mormente, entre pessoas de nível universitário, agressões gratuitas e ofensas de todo o tipo, dirigidas À PESSOA do bacharel; devemos nos ater ao tema em debate; todos têm o direito de serem contra ou a favor do exame; o que não é correto, é que bacharéis em direito com inscrição nos quadros da OAB, que lhes permite advogar, queiram colocar o bacharel em direito, numa posição de inferioridade; mesmo porque nem todos passaram pelo crivo da referida instituição.

Se somos incompetentes ou não, só o mercado de trabalho o dirá. Saliente-se que o exame é extremamente difícil sim; mais do que os exames praticados para ingresso na magistratura. Diante da média ínfima de aprovação, é ingenuidade acreditar, e usar como fundamento, apenas e tão-somente, a pretensa má qualidade de ensino; que é preciso aperfeiçoamento no ensino eu concordo; mas ele deve se iniciar no ensino fundamental; de nada adiantam normas protecionistas de cunho político, tendo por finalidade mostrar uma falsa diminuição no índice de analfabetismo do país, produzindo analfabetos funcionais, até entre as camadas mais humildes da população, isso é sabido; mas daí a generalizar, e dizer que os bacharéis são ignorantes e incompetentes, é afrontar a inteligência, e uma demonstração de ausência de argumento válido extrema.


O Dr. D’Urso é presidente da OAB/SP, portanto, conseqüentemente, personifica referido órgão. Pois bem, em entrevista, cujo assunto versava sobre o exame de ordem, ele se pronunciou, dizendo que hoje não passaria na avaliação; mas justifica sua fala, no fato de ter se especializado na área criminal, e o exame aufere conhecimento básico, em diversas disciplinas; nada mais contraditório e incoerente. Lembram da regra “quem pode o mais, pode o menos?”, se aplica também no caso em tela.


Continuando o raciocínio, temos que o bom advogado criminal, para um bom desempenho na mencionada seara do direito, tem que DOMINAR duas disciplinas, a saber: Direito Penal e Direito Processual Penal; conhecer intimamente a Constituição (Direito Constitucional); ter conhecimentos básicos para aplicação subsidiária em: Direito Civil ( ex. transação penal, crime de dano, etc...); em Direito Tributário (crimes tributários), Direito Administrativo (crimes contra o patrimônio público), Direito Comercial (crimes falimentares); e princípios gerais do direito; esse último, em que pese não constar como disciplina aplicada separadamente no exame, se aplica a todas elas, e no exame, é evidentemente exigido.

Assim posto, notem que para uma boa atuação na seara criminal, é necessário o conhecimento em sete disciplinas, ou seja, 70% do exame, portanto, atingiria ele, apenas 30 pontos; e inevitavelmente reprovado.


Oras, se ele, como ADVOGADO CRIMINALISTA, confessa que não passaria no exame, que dirá o recém formado, ou aquele que reprovado, e não pode pagar por “cursinhos preparatórios”!


Mais ainda, mesmo que considerássemos apenas as duas disciplinas específicas de sua área de atuação; Direito Penal e Processual Penal, a figura que personifica referido órgão, vir à público, e declarar que não passaria no exame, é mais do que prova suficiente, de que o exame não foi feito para auferir conhecimentos mínimos; mesmo porque, até mesmo conhecimento de jurisprudência e súmulas, é exigido do “candidato” (como se estivéssemos concorrendo a concurso público, para investidura em função remunerada); definitivamente, não se trata de exigência de conhecimentos básicos. E mais, se o presidente de uma seccional, confessa que não passaria, sendo ele, como já dito, a personificação daquele órgão, teria a OBRIGAÇÃO de passar, e assim, poder exigir. Como pode continuar argumentando, que o exame tem por finalidade, auferir conhecimentos mínimos, se nem ele mesmo passaria? Como demonstrado, o exame não qualifica ninguém; outrossim, para ser advogado, tem que ser primeiro bacharel, pois sem esse título, não há como ser advogado. Ademais, como já comentado por um colega, “o advogado é essencial à justiça, e não a OAB”. Esta última não existiria, sem os primeiros; portanto, referido órgão, renega a um plano inferior aqueles que viabilizaram sua existência; trocando em miúdos, é o mesmo que “cuspir no prato em que comeu”

Ele seria reprovado; devemos considerá-lo incompetente? Entendo que não; mas a comparação perdeu seu fundamento.

Chegamos à conclusão de que ele seria reprovado mesmo, e por disciplinas que fazem parte de sua área de atuação; que devem fazer parte integrante de conhecimento mínimo, para uma boa atuação na advocacia; notem, que são seis disciplinas que ele deveria conhecer, e obrigatoriamente, passar no exame, posto que, sua inscrição garante sua qualificação. Considerando que ele domine Direito Penal e Processual Penal.

Ademais, aos defensores do exame de ordem, fica a pergunta:

A OAB, como defensora da cidadania, estava onde, quando os acadêmicos cursavam suas faculdades pretensamente deficientes? Por que não defendeu a cidadania daqueles? As falas de defender a cidadania e proteger a sociedade, excluem por acaso o bacharel? Não é ele cidadão, também?


Frise-se, o bacharel não quer acabar com a OAB ou instaurar o caos, ele luta pelo que é direito dele, ainda que outros não o reconheçam; assim, peço aos doutores, ex-bacharéis, que se atenham ao tema, que não ataquem a dignidade daqueles que abraçaram o direito como profissão; o respeito à dignidade humana é também prescrito na Magna Carta, parece que os profissionais do direito esqueceram disso.

Li vários comentários; e dentre eles, muitas ofensas e agressões por parte de advogados; chamaram-nos até mesmo de rábulas!

Definição de rábulas para quem não sabe, é:

“Rábula ou Provisionado, no Brasil, era o advogado que, não possuindo formação em Direito (bacharelado), obtinha a autorização da entidade de classe (primeiro do Instituto dos Advogados; e a a partir da década de 30 da OAB) para exercer a postulação em juízo”.

Portanto, fica ao doutor que assim se referiu aos bacharéis em direito, a lição....Enquanto isso, tem advogado escrevendo “bacharéu”, ao invés de bacharel...

Aos doutores advogados, peço o respeito que mereço, num primeiro momento, como pessoa; e para com o título que adquiri, freqüentando cinco longos anos, com a carga de atividades extra-curriculares devidamente cumprida, e defesa de tese, com a respectiva monografia; diga-se de passagem, com muito empenho, e dedicação, sacrificando meus filhos com minha ausência, abdicando de muita coisa, para pagar a faculdade, e estudar (o que fazia depois que chegava da faculdade, e parava às 04:00, e levantava duas horas e meia depois para levar meu filho na escola; para a seguir, continuar a rotina do dia, dividida entre trabalho, e administração da casa, e todas as implicações dela advindas.

Não comprei meu diploma, não comprei e não compraria, ainda que pudesse, o passaporte para o ingresso nos quadros da OAB....Assim, não são os bacharéis que estão minando a credibilidade do referido órgão, e não é mesmo essa a intenção.

Finalizo, deixando um ensinamento de um grande defensor da democracia, e implacável oponente ao totalitarismo, que são as vestes atuais de nosso país, disfarçado e acobertado pelo manto da falada e não praticada democracia:

“Uma explicação é algo sempre incompleto; sempre podemos suscitar um outro porquê, e esse novo porquê talvez leve a uma nova teoria, que não só explique, mas corrija a anterior” (Karl Raimond Popper)

No mais, minhas cordiais saudações, desejando sucesso, e espaço a todos...


Margarete R Lima

Bacharel em direito com muito orgulho (ou bacharela, como preferirem - é permitido o uso das duas figuras)

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