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Em 82 escolas em áreas carentes do país, ensino é de Primeiro Mundo- Aula de excelência na pobreza


BRASIL TEM 82 ESCOLAS DE 1º MUNDO EM ÁREAS POBRES



Jornal O Globo 8/7/2012

Aula de excelência na pobreza. Em 82 escolas em áreas carentes do país, ensino é de Primeiro Mundo.


Odilon Rios



O prêmio ESSO foi concedido a Odilon Rios na categoria Educação, pela participação na reportagem “Aula de excelência na pobreza”.

O Prêmio Esso é considerado o mais importante do jornalismo brasileiro e destinou R$ 112 mil aos seus vencedores este ano. A comissão julgadora avaliou 1.302 trabalhos em 2012, recorde para o Esso, que é concedido desde a década de 1950.


Comissão de Premiação

A Comissão de Premiação do Prêmio Esso de Jornalismo 2012, que julgou os trabalhos de mídia impressa (à exceção de Fotografia), foi composta por Francisco Ornellas, Luiz Garcia, Mario Vitor Santos, Thales Guaracy e Xico Vargas, enquanto a comissão responsável pelos trabalhos de Telejornalismo foi integrada por Ana Gregati, Christina Pinheiro eNelson Hoineff. Já para os trabalhos de Fotografia foi criada uma comissão especial formada por 50 editores de Fotografia dos principais veículos brasileiros.

Jornalistas : Prêmio ESSO na Categoria Educação

O Jornal  o Globo produziu uma série de reportagens que foram realizadas  com a cooperação de vários jornalistas : Odilon Rios (Alagoas),Efrém Ribeiro ,Antônio Gois, Chico Otávio, Letícia Lins e Carolina Benevides, do o Globo.
Fontes:G1







O prêmio ESSO foi concedido a Odilon Rios na categoria Educação, pela participação na reportagem “Aula de excelência na pobreza”.



AS SUPERESCOLAS.

O Brasil ainda está distante da meta de garantir a toda criança um ensino de qualidade, mas há, dentre as mais de 40 mil escolas públicas do país, um pequeno grupo que se destaca pela excelência. São colégios que, mais do que simplesmente figurar nas primeiras posições de rankings de avaliação, conseguem algo ainda mais extraordinário: atender alunos de baixíssima renda e deixá-los com indicadores de qualidade compatíveis aos de nações desenvolvidas.

Com ajuda do economista Ernesto Martins Faria, da Fundação Lemann, O GLOBO identificou essas escolas e investigou o que há em comum entre elas. Numa série de reportagens que se inicia hoje, há relatos do bom trabalho pedagógico em localidades improváveis como o interior amazonense, a área rural do Piauí, a periferia de Alagoas ou o sertão do Ceará.

Nas estatísticas e nas visitas realizadas pelos repórteres, foi possível identificar que o bom resultado não é, como resumiu Faria, fruto do acaso. Nessas escolas, é notável o esforço da direção e dos professores em não deixar que nenhum aluno fique para trás e de corrigir as deficiências na aprendizagem e os problemas de frequência assim que eles são detectados. Também chama a atenção o bom ambiente escolar, com poucos casos de indisciplina e professores estimulados.

O levantamento mostra que há no país 82 estabelecimentos públicos que, mesmo atendendo alunos que se encontram entre os 25% mais pobres do Brasil, conseguem atingir no Ideb, principal avaliação federal de qualidade do ensino, média igual ou superior a 6,0, considerada pelo MEC como patamar hoje de nações desenvolvidas.

Para identificar este grupo, Faria calculou, a partir das respostas de alunos sobre posse de bens de consumo nos questionários respondidos na Prova Brasil - exame do MEC aplicado a todos os colégios públicos do país - um indicador do nível socioeconômico de cada estabelecimento. As 43.574 escolas públicas para as quais foi possível fazer este cálculo foram então ranqueadas por dois critérios: 1) de acordo com o nível de pobreza dos estudantes e 2) pelo desempenho no Ideb.

Do confronto entre os dois rankings, foi possível verificar colégios que ganham mais de 40 mil posições. Ou seja, trabalham com os alunos da rabeira do ranking de pobreza, mas levam-nos ao topo do aprendizado.

Especialista defende horário integral

Para o diretor executivo da Fundação Lemann, Denis Mizne, mesmo sendo raras, o exemplo dessas escolas demonstra que é possível dar um ensino de qualidade para crianças mais pobres. Para isso, no entanto, é preciso que as instituições que atendem estes alunos sejam justamente as mais bem preparadas para compensar a dificuldade que eles apresentam por causa da condição socioeconômica dos pais.

- A gente se acostumou no Brasil a justificar o mau desempenho do aluno pela baixa educação dos pais. Agora, precisamos escolher se vamos tratar a educação pública como ferramenta que mantém as desigualdades ou que ajuda a compensá-las, de modo que as condições de pobreza da família em que a criança nasceu não sejam o único determinante de até onde ela conseguirá chegar. O exemplo dessas escolas prova que isso é possível.

Ser possível, no entanto, não significa ser simples. Para o pesquisador Francisco Soares, da UFMG, autor de vários estudos sobre escolas eficazes, a dificuldade enfrentada por colégios com alunos de baixo nível socioeconômico é que, além da desvantagem por atender filhos de pais menos escolarizados, esta condição vem às vezes associada a problemas como a violência dentro e fora de casa.

- Para estes alunos, a pedagogia precisa ser diferente. É nestas situações que precisamos de projetos de tempo integral - diz Soares.

No interior do Amazonas, nenhum estudante fica para trás

Escola Dom Bosco dá reforço individual a aluno com dificuldade

EURINEPÉ (AM) - Na Escola Estadual Dom Bosco, em Eurinepé, a 1.200 quilômetros de Manaus, a fase de matrícula oferece aos professores a possibilidade de um diagnóstico precoce. É nesse momento que começa o “drama do dedão”. Quando um pai, constrangido, oferece a impressão digital no lugar da assinatura, o colégio já sabe que aquela criança precisará de atenção especial. Se for preciso, o trabalho ultrapassa a sala de aula e vai até a casa do aluno, para blindá-lo dos efeitos perversos no aprendizado de uma família cujo chefe não sabe ler ou escrever.

Esse trabalho diferenciado, que individualiza o aluno sem afetar o coletivo, tornou a Dom Bosco um fenômeno educacional e orgulho do Amazonas. A escola obteve o maior aumento no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb), saindo de pífios 2,7 em 2005 para 8.7 em 2009. Da aposta no reforço escolar à disciplina em sala, passando pela oferta de duas merendas ao dia, são várias as explicações para o bom resultado. De todas elas, contudo, o maior destaque é para o envolvimento da família do aluno no aprendizado.

— Até 2015, queremos erradicar completamente o dedão de nossas pastas — diz a coordenadora Maria de Fátima Libânio da Silva.

Fátima se refere ao projeto de alfabetização de pais de alunos, temporariamente suspenso, mas que a escola pretende reativar como um projeto estratégico para se manter no grupo de elite do Ideb. Não será fácil. Uma das oito escolas estaduais de Eirunepé, a Dom Bosco, com 330 alunos, dos quais 80% recebem Bolsa Família, é uma ilha de excelência no bairro Santo Antônio, um dos mais carentes da cidade. O analfabetismo dos adultos não chega a ser o pior dos problemas do local, onde palafitas se projetam sobre valões infestados de insetos e outras pragas que fazem morada no esgoto a céu aberto.



A arquitetura da Dom Bosco, que oferece do fundamental à quinta série (crianças de seis aos 12 anos), não tem nada de especial. Alugado pela Igreja Católica ao governo do estado, o prédio de alvenaria e madeira, de um pavimento, lembra os alojamentos ocupados pelos desbravadores do passado na Amazônia. Mas as salas de aula são amplas, arejadas e coloridas por desenhos, brinquedos educativos e outras peças didáticas. O ponto alto, porém, é o amplo terreno em torno da construção. Ocupa um quarteirão inteiro, a maior parte gramada e pontuada por árvores frondosas.

A diferença entre o ambiente externo e a escola acaba contribuindo para o sucesso de outra das estratégias de ensino da escola: o reforço escolar. A presença dos alunos vai além do horário oficial. Quem estuda no turno da manhã, encerrado às 11h30m, não chega a tirar o uniforme quando almoça em casa. Às 14 horas, a maioria já está de volta à Dom Bosco, com a mesma disposição, para aulas direcionadas às dificuldades específicas, só interrompidas pela segunda merenda do dia.

Jorge Pedrosa de Oliveira, de 8 anos, só tem tempo para assistir “Os vingadores” na TV, antes de retornar para o reforço. Enquanto vê o desenho predileto, devora um prato de peixe, baião de dois e farinha. A mãe, Alcenir Pedrosa Fialho, de 39 anos, recebe os forasteiros com desconfiança. Sua palafita, de sala e quarto, denuncia o estado de penúria da família. A última visita de estranhos tinha sido do Conselho Tutelar, no ano passado, alertado pela direção da escola devido ao número elevado de faltas de Jorge.

— Jorge, com dores na barriga, começou a faltar. Um dia, descobri que ele tinha uma ferida infeccionada na barriga, causada pelo tombo de uma árvore. Os médicos chegaram a retirar um pedaço de madeira de seu corpo — disse a coordenadora.

Fátima colocou o menino na garupa da moto e foi até sua casa, onde constatou que a mãe, alcoólatra, levara sete facadas. O pai era ausente, e o dinheiro do Bolsa Família, praticamente gasto com o vício no “corote”, nome local da cachaça. Acionado, o Conselho Tutelar ajudou a escola a monitorar a família. Hoje, já em casa e livre do álcool, Alcenir se reaproximou do ex-companheiro e passou a dar mais atenção aos três filhos — além de Jorge, tem uma menina adotiva e um filho adolescente com dificuldades mentais.

Em tese, o reforço é dado em sala pelos próprios professores, mas o espaço é insuficiente, e as aulas acabam acontecendo debaixo das árvores, algumas vezes oferecidas por auxiliares administrativos e até mesmo por alunos. Virna Faustino de Barros, de 12 anos, é uma das alunas voluntárias. Filha de um casal de professores, a ex-aluna do Dom Bosco conta como ajudava os colegas nas aulas de reforço:

— Sempre escolhemos os que têm mais dificuldades, geralmente bagunceiros.

Fundada pelos padres em 1982, a Dom Bosco não foi sempre assim. A escola, em 2005, chegou ao fundo do poço com uma das piores avaliações do estado, 2.7 no Ideb. A coordenadora regional de Educação de Eurinepé, Suely Pinheiro Neblina, convocou na época uma reunião:

— Os professores ficaram revoltados, com raiva de mim. Mas saí feliz de ver a revolta deles. Sabia que algo acabaria acontecendo.

Os resultados não demoraram. Hoje, um quadro exposto na entrada do colégio mostra outro motivo de orgulho. Em 2010, a Dom Bosco obteve 0% de reprovação e abandono.

No melhor Ideb do Nordeste, até pais assistem aulas quando preciso

TERESINA - Durante o período de chuvas, os professores da Escola Municipal Laurindo de Castro, no povoado Poço, na Zona Rural de Teresina, saem das salas de aulas para ajudar os alunos a atravessar uma ponte sobre um riacho que fica coberto pelas águas. Na outra margem, uma Kombi as aguarda. Para chegar ao local, é preciso percorrer um emaranhado de estrada e mata. O colégio atende filhos de lavradores e de mulheres que trabalham como domésticas ou diaristas em residências a 38 quilômetros de distância, no Centro da capital piauiense.

A escola é bem cuidada, um oásis em contraste com o ambiente externo. No teto, mês passado, bandeirolas e balões enfeitavam o ambiente para as festas juninas. As salas são coloridas, decoradas com mensagens, desenhos, números e palavras separadas em sílabas.

A professora Ingrid Maria de Oliveira Vaz afirma que os 130 alunos são da Zona Rural, filhos de cortadores de cana-de-açúcar e de empregadas domésticas, quase todos sem escolaridade para ajudar as crianças no dever de casa. Mesmo assim, a Laurindo de Castro registrou, em 2009, um Ideb (Índice de Desenvolvimento de Educação Básica) de 7,7, o maior do Nordeste.

O estudante Luiz Reis de Oliveira, de 7 anos, sai de casa às 6h30m, entra no ônibus escolar, e chega à escola apenas às 8h.

- Demora, mas aqui a gente aprende a ler, escrever e a contar. Eu gosto daqui - diz ele.

Ingrid conta que a escola tem muitos alunos de pais separados, de famílias desestruturadas, mas que dão muito apoio à formação dos filhos:

- Temos muitos alunos que moram com os avós, que são analfabetos, mas, mesmo analfabetos, pedem as tarefas, cobram e olham se as crianças estão respondendo às questões, apesar de não saberem do que tratam.

Praticamente não há rotatividade no corpo docente. A última mudança ocorreu há um ano e meio, quando uma adoeceu e se afastou do magistério. Os pais são participativos, mas, quando a direção os chama e eles não atendem, os professores ou a diretora vai até a casa.

- Se a família ou a criança está doente, vamos até lá saber o que está acontecendo - diz Ingrid.

O sinal de alerta para chamar os pais é quando surge algum aluno com problema grave de aprendizagem, de comportamento ou mais agressivo. Em muitos casos, os professores identificam que um desequilíbrio na família, como uma separação, e pedem que a mãe assista às aulas com a criança até que o transtorno passe, a fim de não atrapalhar o desempenho escolar. Também são oferecidas aulas de reforço ao aluno com dificuldades.

O diagnóstico imediato dos problemas e a solução rápida ajudam a explicar o sucesso. Quando percebem que o aluno está ficando para trás, professores continuam ministrando aulas para os demais, mas elaboram atividades separadamente para os estudantes em dificuldades. As avaliações são contínuas. Não se espera o resultado em provas no fim do mês para corrigir equívocos. No ano passado, apenas um aluno foi reprovado.

- Nosso segredo é a participação democrática. Todos os problemas são discutidos e resolvidos na mesinha que temos, com os professores e a diretora. A gente acredita no trabalho coletivo. Começamos com a educação dentro do ônibus escolar, na sala de aula, na hora da merenda - ensina a mestra.



Fonte: Jornal O Globo 8/7/2012

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