O CASO MACEIÓ : DEMOCRACIA E DINHEIRO.



O CASO MACEIÓ : DEMOCRACIA E DINHEIRO.

*Alberto Saldanha



A eleição na capital alagoana expôs três blocos e suas pretensões na disputa para governador e senador em 2006. Um deles o projeto do governador Ronaldo Lessa, por meio do seu partido, o PSB, que há doze anos conduz a prefeitura e há seis o governo do Estado. O segundo deveu-se à reorganização de um antigo bloco que tem nos deputados federais João Lyra (PTB) e José Thomaz Nonô (PFL) suas principais figuras. E, por fim, os conhecidos na política alagoana como “senadores siameses”, Renan Calheiros (PMDB) e Téo Vilela (PSDB). Lessa teve ao seu lado, após idas e vindas do PT nas administrações do PSB, o partido de Lula, o PC do B, o PL e o PV, entre outros menores. Tentou reconstruir no estado uma coligação semelhante à base do Governo Federal. Seu maior obstáculo foi seu próprio partido que, dividido entre “os partidários do governador” e “os da prefeita Kátia Born”, inviabilizou a possibilidade de um nome de fora das fileiras governistas como alternativa sucessória, diante do visível desgaste da segunda gestão da prefeita. O resultado foi que o “grupo da prefeita” venceu e indicou o seu vice, Alberto Sexta Feira, como o candidato. O PT, por sua vez, escolheu o deputado estadual Paulo Fernandes, o Paulão, como candidato a prefeito. Em seguida, diante do acordo do governador Lessa com a direção nacional do PT, desistiu e indicou o presidente do sindicato dos bancários de Alagoas, José Roberto, como vice. Foi a primeira demonstração de que a sucessão de 2006 exerceria influência no pleito municipal.

O usineiro e deputado João Lyra, que se colocara inicialmente como candidato a prefeito, optou pela aliança com aquele que há dois anos liderava as pesquisas de intenções de voto, o deputado estadual Cícero Almeida, do PDT, conhecido pelo seu trabalho como repórter policial na TV e por suas clínicas assistenciais.

 A contrapartida foi a indicação de sua filha, Lourdinha Lyra, como vice. Dessa forma, surgia a candidatura da coligação PDT, PTB, PFL e PP.

Os dois senadores, Calheiros e Vilela, que estiveram juntos com Ronaldo Lessa em 2002, sentindo o desinteresse do PSB em abrir mão da indicação da cabeça de chapa e as dificuldades da gestão da prefeita Born, resolveram construir uma alternativa.

Aliando-se ao PPS tentaram inicialmente uma chapa formada pelo senador do PSDB como prefeito e o ex-deputado federal do Partido Popular Socialista, Régis Cavalcante, na condição de vice. Alegando razões de foro íntimo, que parecem misturar questões de ordem pessoal com uma certa inaptidão para cargos executivos, o senador Vilela, após a convenção partidária, renunciou a sua indicação e criou um impasse na coligação. De imediato, a solução que se apresentava era a substituição pelo seu vice, mas assim não pensaram “os senadores siameses”. Não desejando que o indicado do PPS assumisse a condição de cabeça da chapa, decidiram por uma opção considerada diferente: a apresentação de um nome que não faria parte da clássica militância, entretanto teria o perfil de celebridade, o médico cirurgião-cardíaco José Wanderley. Apesar de ser suplente do senador Calheiros, foi indicado como uma figura sem os “vícios da política”.

E, para a infelicidade do PPS, diante do pragmatismo dos dois senadores, só restou formar uma “chapa puro sangue” e se consolar com o então apoio da senadora Heloisa Helena. Mais uma vez, o não tão longe 2006 se fez presente. 

As candidaturas do PSTU, do PRP e do Pastor Ildo Rafael pelo PMN, protagonista de mais uma das contribuições negativas para a consolidação da democracia no país, completaram o quadro de postulantes.



O tom da campanha, como não poderia deixar de ser, foi “a mudança”. Com exceção do candidato Alberto Sexta Feira (PSB, PT, PCdoB, PV), todos se apresentaram como a “verdadeira” solução para os vários problemas da capital. Por outro lado, o candidato governista reconhecia as falhas, mas se colocava como o mais competente para os desafios, pois seria o candidato do governador e do presidente da República, ao
mesmo tempo em que procurava evitar a aparição da prefeita no guia eleitoral.


Desde logo, a candidatura do PDT, não somente pelo carisma do seu candidato, mas também pelo apoio logístico do seu principal financiador (as empresas do Grupo JL), se manteve à frente das pesquisas de intenção de votos garantindo, desse modo, sua presença num eventual segundo turno. Então, surgiu a dúvida sobre quem conseguiria o segundo lugar. Diante do desgaste do candidato situacionista, o Dr. Wanderley cresceu e chegou no dia 03 de outubro empatado tecnicamente com o candidato do PSB. É claro
que essa luta pela vaga no segundo turno foi conduzida por um vasto material de ataques pessoais. Aqueles que até há pouco tempo estavam juntos, passaram a enxergar um no outro o “mal”. Ao mesmo tempo, a campanha do primeiro colocado tentava por todos os meios definir a eleição no primeiro turno. Entre outras coisas, tornou-se uma marca a conduta tendenciosa do jornal de propriedade do deputado João Lyra, O Jornal, o que resultou na apreensão da edição do dia 03/10 pela Justiça, por divulgar uma pesquisa que induzia o eleitor a acreditar que Cícero Almeida ganharia no primeiro turno. Sua manchete de primeira página “Pesquisa Vozes: Cícero: 45%; Outros: 39%”.


A atuação da imprensa constituiu-se um capítulo à parte. Nos jornais impressos foi ao mesmo tempo salutar e engraçado ver a Gazeta de Alagoas, pertencente à família do ex-presidente Fernando Collor, assumir uma postura independente. Sem o interesse direto em uma das candidaturas e ainda sofrendo os reflexos da derrota de Collor para governador em 2002, o jornal, rádios e televisão das organizações Arnon de Mello
apostaram no jornalismo investigativo e de utilidade pública. Os outros dois jornais diários se dividiram: O Jornal, ao lado de Cícero Almeida, e a Tribuna de Alagoas, propondo a isenção, mas favorável ao candidato da situação. Não se pode esquecer que, além da disputa eleitoral, os jornais travavam uma famosa e antiga briga de família, pois a Tribuna passou a ser de propriedade do usineiro Carlos Lyra, maior fortuna do estado e inimigo do irmão, João Lyra, segundo colocado na lista dos mais ricos.

Nos canais de televisão a TV Gazeta seguia a mesma linha editorial do veículo impresso. A TV Pajuçara, afiliada do SBT, propriedade do deputado federal do PFL Thomaz Nonô e a TV Alagoas, afiliada da Band (responsável pelo programa policial que projetou Cícero Almeida), pertencente ao ex-vice-governador e presidente regional do PDT, Geraldo Sampaio, ora mais discretas outras nem tanto, assumiam o discurso
oposicionista (A TV Alagoas ficou fora do ar por cerca de oito horas no dia 03/10, por não cumprir determinação da justiça eleitoral de conceder direito de resposta ao candidato do PMDB, José Wanderley). Continue lendo aqui


*Doutor em História Social pela Universidade Federal Fluminense – UFF e professor do Departamento de Ciências Sociais da Universidade Federal de Alagoas – UFAL

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